Estimados leitores, em se
levando em conta os temas relacionados com gols contra, que semana! Entre eles
temos as bolas fora de Barcelona e Real Madrid, que deixaram a o mundo pasmo e
sem fé em mais nada. E tivemos ainda os papelões épicos do John Terry, na sua
tentativa de destruir o próprio time, e da Caroline Celico, mulher do
ex-jogador Kaká, com a sua inacreditável declaração de que se o marido trai, a
culpa é da mulher.
Eu mesmo, zagueiro à moda
antiga, de quebrar o dedão chutando o poste e achar graça, precisei de uma dose
tripla de água de melissa com gotinhas de maracujá antes de sentar para
escrever sobre o assunto. Precisei reler a entrevista que a nossa ex-bispa deu
para a Istoé Gente várias vezes, antes de acreditar que sim, a nossa
brava ex-bispa disse isso mesmo. Se o homem vai ali ver se o amor está na
esquina; se ele sai atrás de uma Coca Litrão e só volta quatro horas depois
cheirando a Amor Gaúcho; se ele sai de viagem e curiosamente esquece de levar a
mala; se ele passa a tarde em reunião de trabalho na sauna Você que Sabe, a
culpa, é, só pode ser, não há como ser diferente, da sua distraída esposa.
Caroline, Caroline. Você,
com apenas essa declaração desmiolada deixou milhões de brasileiras em um
impedimento mal marcado, coisa que magoa a alma.
Já o aprontador em
potencial, o senhor seu marido, nunca foi visto fazendo declarações tão tolas,
ao menos em público, ou com palavras. Ele foi visto distribuindo passes de
qualidade duvidosa e finalizações com o poder explosivo de um traque da Fogos
Caramuru, no Santiago Bernabeu por esses dias. Mas isso acontece, com os
melhores jogadores, com os piores jogadores, e com os Kaká desse mundo. Já as
suas declarações, senhora dona Caroline Amélia, foram de abrir os brônquios de
quem mora na poluição de São Paulo.
Trair alguém é sempre
responsabilidade de quem o faz. Costuma ser escolha, nunca uma obrigação.
Maridos e mulheres que resolvem que querem outras emoções, o fazem pelos mais
diversos motivos, todos eles associados ao desejo. Não é preciso sequer ser zagueiro
para saber disso.
As pessoas fazem o que fazem
porque querem. As pessoas casam porque querem, e fazem sexo com outras pessoas
que não as titulares porque querem. Elas se apaixonam sem querer, porque isso
não é escolha, mas fazem algo a respeito porque querem. John Terry acertou as
costas de um adversário porque quis e achou que ninguém ia ficar sabendo. As
pessoas traem exatamente pelo mesmo motivo.
Caroline, a ex-bispa, foi
querer fazer média e se mostrar ainda mais boazinha do que a bispa Sônia e
olhem no que deu. A bispa Sônia sabe ser tão boazinha consigo mesma que andava
por aí com uma bíblia para as questões do espírito e milhares de dólares
ilegais para o resto. A Caroline quis ser insuportavelmente boazinha, talvez
inspirada nos cânticos gospel que despeja por aí, e foi dizer exatamente o que
jamais deveria ou poderia, não num mundo onde as mulheres aprenderam a
respeitar a si mesmas.
Amélia, a que era mulher de
verdade, teria adorado a Caroline, se elas pudessem sentar pra tomar um
Grappette e cerzir as meias dos maridos enquanto comparavam histórias de vida e
dor. Isso só não é possível porque a última Amélia, a mulher de verdade, foi
vista lá pelos anos 30, e nunca mais. Caroline deve se sentir muito só, nesse
mundo de mulheres que não levam todas as culpas para casa.
Não, estimada ex-bispa, os
homens não traem as suas diletas esposas porque essas não os compreendem e
ficam vendo novela em vez de melhor os servirem. As mulheres não traem seus
maridos porque eles deixaram de olhar para elas com o mesmo brilho no olhar que
tinham nos tempos do colégio, na aurora de suas vidas e seus tempos de
entusiasmo e devassidão doméstica. Não se trai nem mesmo por causa do cansaço
que um possa sentir pelo outro, de um casamento que se torna tão excitante quanto
uma visita ao Banco do Brasil, ou de uma sensação de que o melhor passou e o
mundo lá fora se tornou mais atraente.
O fato simples e real é que
casamento é uma coisa e o mundo lá fora é outra, e que os seres humanos muito
frequentemente anseiam por ambos. Isso não tem nada de estranho, nada de
incompreensível, e, seguramente, não é culpa de ninguém.
Talvez maus zagueiros e bons
cristãos precisem sentir culpa por tudo. Talvez a Caroline seja ou acredite ser
uma boa cristã. Talvez ela tenha achado que dizendo o que disse, deixaria ainda
mais aberto o caminho seguro para o céu.
Disraeli
disse que ninguém está livre de falar besteiras em público, e o único desastre
é fazê-lo solenemente. Isso valia no século 19, quando ele era o grande
zagueiro da política inglesa, e certamente segue valendo hoje. Azar da
Caroline, se ela estava ocupada demais cantando louvores ao Senhor, e deixou de
lado Disraeli.
Azar
dela. E, por extensão, nosso.
(fonte: http://terramagazine.terra.com.br/zagueiro/blog/2012/04/27/o-gol-contra-de-caroline-amelia/)